Estive longe, estive perto...

A Igreja celebra neste sábado, dia 25, a Festa de São Tiago, dito o Maior, pois era mais alto, ao contrário de Tiago Menor, filho de Alfeu e, segundo certa tradição, irmão do Senhor e primeiro bispo de Jerusalém, mais exíguo de estatura física. Este outro Tiago, o Maior, o de hoje, era filho de Zebedeu e irmão do apóstolo São João... Segundo uma tradição mais que milenar, seus restos encontram-se em Compostela, na Espanha, que se tornou, na Idade Média, um dos grandes centros de peregrinação dos cristãos. Ainda hoje o é.
Tiago! Foi o primeiro dos apóstolos a derramar o sangue por Cristo, por volta do ano 42. Dizem-nos os Atos dos Apóstolos, num único versículo (cf. 12,2), que Herodes “mandou matar à espada Tiago, irmão de João”. Só isto; mais nada! Não se diz o que Tiago falou, como procedeu, como se desenrolou a sua execução. Nada! Num único e curto versículo foi dito tudo: Tiago, por amor a Jesus, pelo Nome de Jesus, foi assassinado, perdeu a vida pela espada...
Como esse homem chegou a tal destino tão cruento? O que o conduziu a essa situação de proscrito, a ponto de sua morte agradar aos judeus (cf. At 12,3)?
Voltemos no tempo, ao Mar da Galileia, distante de Jerusalém, cerca de 14 anos antes... Tiago e seu irmão João eram ainda jovens, certamente com seus sonhos, suas sedes de viver e ser feliz... Estavam lá, às margens daquele mar que era o seu mundo. Estavam lá, na barca de Zabedeu, consertando as redes... E Jesus passou, e os chamou, e os cativou; e eles, “deixando o pai Zebedeu no barco com os empregados, partiram em seu seguimento” (Mc 1,19s). Assim começou tudo: Tiago deixou sua família, seu futuro de pescador, sua Cafarnaum, para seguir Jesus, colocando os passos da sua vida nos passos do Mestre... E nunca mais teve sossego, apesar da paz no seu coração...
Era impulsivo e tendia à violência, como o seu irmão, a ponto de Jesus apelidá-los de “filhos do trovão” (cf. Mc 3,17; Lc 9,51-54). E, no entanto, esse Tiago e seu irmão estavam entre os discípulos preferidos de Jesus, seu companheiro na glória do Tabor e na agonia das Oliveiras (cf. Mc 9,2ss; 14,32ss). Nem sempre compreendeu bem o seu Senhor; às vezes foi seduzido pela honra do primeiro lugar (cf. Mc 10,35ss). Mas, que ele amava Jesus, amava; que deseja segui-lo de todo o coração, desejava. Tanto que, de modo afoito e inocente, prontifica-se a beber o cálice do Senhor e ser mergulhado no mergulho de dor no qual o Salvador seria batizado (cf. Mc 10,38s).
E agora, naquele ano 42, mais ou menos, Tiago consumou seu amor a Jesus. Não havia aí mais palavras, não havia mais promessas nem ilusões, mas somente a serena certeza da união indestrutível com o seu mestre: “Não há maior prova de amor que dar a vida pelo amigo” (Jo 15,13). E Tiago, agora, poderia consumar a entrega total, de amor ao Senhor, que se deu na cruz, totalmente, pelo seu discípulo...
Tiago, o Maior, primeiro dos Doze a beber o cálice do Senhor, primeiro dos Doze a ser batizado na dor do Senhor... Que ele rogue por nós, rogue pelos discípulos de todos os tempos, para que compreendamos e creiamos de verdade que em Cristo Jesus está nossa vida. Vale a pena deixar família e barco e partir em seu seguimento, até a eternidade...

A Catedral de São Tiago de Compostela: meta de peregrinação.
Mas, tudo começou no Mar da Galileia, com o pai e as redes deixadas para trás
por causa de Jesus nosso  Senhor...

Tu és Pedro!

Ao Santo Padre FRANCISCO,

Sucessor de Pedro Apóstolo,

Servo dos Servos de Deus,

a nossa homenagem filial,

a nossa fervorosa oração,

a nossa fiel adesão

e a nossa efetiva e sincera obediência!





Tu és Pedro!

Sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja!

As portas do Inferno

Não prevalecerão!

VISITA PASTORAL

Deus seja louvado pela visita pastoral que celebramos na paróquia são Francisco de Assis, em Foz do Iguaçu. Obrigado a todos pela acolhida fraterna e amiga. Minha gratidão ao frei Silvio, frei Miguel e frei Antonio. A convivência na casa com dona Maria, o sr. Joaquim e o jovem fotógrafo adão foi excelente!  

Que o bom pastor abençoe também a visita, que inicio amanhã, dia 1/7/15, na Paróquia Nossa Senhora da Luz.


O ministro ordenado e o agente de pastoral devem tornar presente a fragrância da presença solidária de Jesus e o seu olhar pastoral- evangelii gaudium...



Laudado si - louvado seja meu Senhor e Bom Pastor, Jesus!






















'Laudato Si'


Foi divulgada hoje a 'Laudato Si', primeira encíclica escrita exclusivamente pelo Papa Francisco. A encíclica 'Lumen Fidei', que saiu já no pontificado atual, tinha sido escrita em grande parte pelo Papa Bento XVI.
A nova encíclica é bastante extensa, 187 páginas, e, como já se sabia, trata bastante de temas ecológicos e de sustentabilidade dos recursos naturais.
Quando se trata de ecologia não é muito comum ver três críticas que o Papa faz: no parágrafo 50 à mentalidade contraceptiva, no parágrafo 155 à transexualidade e ideologia de gênero e no parágrafo 120 ao aborto. Vejamos as palavras do Papa:
50. Em vez de resolver os problemas dos pobres e pensar num mundo diferente, alguns limitam-se a propor uma redução da natalidade. Não faltam pressões internacionais sobre os países em vias de desenvolvimento, que condicionam as ajudas econômicas a determinadas políticas de «saúde reprodutiva».
155. A ecologia humana implica também algo de muito profundo que é indispensável para se poder criar um ambiente mais dignificante: a relação necessária da vida do ser humano com a lei moral inscrita na sua própria natureza. Bento XVI dizia que existe uma «ecologia do homem», porque «também o homem possui uma natureza, que deve respeitar e não pode manipular como lhe apetece».
Nesta linha, é preciso reconhecer que o nosso corpo nos põe em relação direta com o meio ambiente e com os outros seres vivos. A aceitação do próprio corpo como dom de Deus é necessária para acolher e aceitar o mundo inteiro como dom do Pai e casa comum; pelo contrário, uma lógica de domínio sobre o próprio corpo transforma-se numa lógica, por vezes subtil, de domínio sobre a criação.
Aprender a aceitar o próprio corpo, a cuidar dele e a respeitar os seus significados é essencial para uma verdadeira ecologia humana. Também é necessário ter apreço pelo próprio corpo na sua feminilidade ou masculinidade, para se poder reconhecer a si mesmo no encontro com o outro que é diferente.
Assim, é possível aceitar com alegria o dom específico do outro ou da outra, obra de Deus criador, e enriquecer-se mutuamente. Portanto, não é salutar um comportamento que pretenda «cancelar a diferença sexual, porque já não sabe confrontar-se com ela».
120. Uma vez que tudo está relacionado, também não é compatível a defesa da natureza com a justificação do aborto. Não parece viável um percurso educativo para acolher os seres frágeis que nos rodeiam e que, às vezes, são molestos e inoportunos, quando não se dá proteção a um embrião humano ainda que a sua chegada seja causa de incômodos e dificuldades: «Se se perde a sensibilidade pessoal e social ao acolhimento duma nova vida, definham também outras formas de acolhimento úteis à vida social».


Louvado sejas, meu Senhor, por todas as tuas criaturas!

Há meses fala-se da publicação de uma nova encíclica pelo Papa Francisco; desta vez, sobre questões ambientais. Agora é fato: dia 18 de junho será publicada a encíclica prometida, ainda sem título conhecido; mas o tema é mesmo o das questões ambientais, com suas várias implicações.
Não é a primeira vez que o Magistério da Igreja se ocupa com questões ambientais. Bento XVI já abordou o tema na encíclica Caritas in Veritate (2009), convidando a humanidade a um novo relacionamento com a natureza, tendo em conta o desígnio de Deus Criador e a solidariedade social (cf nº 48-52). Tratou da ecologia do ponto de vista ético – da “urgente necessidade moral de uma nova solidariedade”; ensinou que a responsabilidade pelo cuidado da natureza é global; que é preciso pensar num “governo responsável sobre a natureza para cuidar dela, fazê-la frutificar e cultivar, para que ela possa acolher e alimentar dignamente a família humana e quem mais nela habita.
Os ensinamentos de Bento XVI são fundamentais para a dimensão ética da nossa relação com a natureza: “o ambiente natural não é apenas matéria de que possamos dispor ao nosso bel-prazer, mas obra admirável do Criador, contendo uma ‘gramática’, que indica finalidades e critérios para uma utilização sábia, e não instrumental ou arbitrária” (nº 48). Na sua encíclica, Bento XVI também oficializou na linguagem do Magistério da Igreja o conceito de “ecologia humana”, tratando da correta convivência das pessoas em sociedade e em relação ao meio ambiente.
O Papa Francisco, desde que foi eleito, deu sinais de que esta também seria uma preocupação sua. Nem poderia ser diferente, pois é missão do Magistério falar do sentido sobrenatural de toda realidade. Pouco tempo depois de eleito, na audiência geral de 5 de junho de 2013, já falou da necessidade de adequar o progresso econômico e o uso das novas tecnologias ao respeito pela natureza e pela “ecologia humana”. Em várias ocasiões, nos 27 meses de seu pontificado, retornou às temáticas ambientais, mostrando suas implicações para a fé e a moral, a solidariedade social e a paz.
A publicação de sua encíclica reúne, agora, uma reflexão sistemática sem precedentes sobre a ecologia. Ninguém imagine que o Papa esteja interessado em alguma ideologia ou partido ambientalista... As questões postas têm basicamente três grandes motivações, à luz das quais convém ler a encíclica.
Em primeiro lugar, a questão tem a ver com a fé cristã no Deus Criador. Estamos sendo levados, por teorias correntes sobre as origens do universo, a “crer” que o mundo surgiu por si mesmo, descartando a necessidade de um Criador. A teoria da evolução não é incompatível com a fé cristã, contanto que não exclua o Deus Criador. Mas a exclusão absoluta do ato criador de Deus – “no princípio” – requer um ato de fé ainda maior do que a fé no Deus Criador. Precisamos voltar a valorizar o primeiro artigo de nossa profissão de fé: “Creio em Deus, Pai Criador do céu e da terra...” Tratar com o devido respeito a natureza, obra de Deus, é consequência de nossa fé em Deus.
Em segundo lugar está a preocupação com a responsabilidade do homem sobre a natureza: ao homem está entregue o cuidado da natureza, que é a “casa comum” da família humana e o “jardim”, que acolhe, sustenta e alegra a família humana e as demais criaturas. Não podemos nos considerar os “donos absolutos do mundo” e nos transformar em predadores da natureza; dela devemos ser cultivadores responsáveis, para que continue a ser pródiga de bens para as criaturas de Deus que ela abriga. Estragar e depredar a natureza é pecado contra Deus e o próximo.
A terceira “preocupação ambiental” do Magistério do Papa Francisco e da Igreja é a da solidariedade social: a terra, com seus frutos, o ar, a água e a luz do sol são para todos; a natureza não é propriedade de ninguém em absoluto, mas um bem destinado a todas as criaturas de Deus. O uso egoísta e ganancioso da natureza é contrário à justiça, à solidariedade e à paz. E ameaça a sustentabilidade da própria natureza.
São Francisco de Assis compreendeu isso muito bem e o expressou no seu Cântico das Criaturas: “louvado sejas, meu Senhor, pelo irmão sol, pela mãe terra, pela irmã água... e por todo ser!” Convido a acolher e ler a encíclica com profundo interesse.
Publicado no jornal O SÃO PAULO - Edição 3056, de 17 a 23 de junho de 2015

GUARDAR A CRIAÇÃO INTEIRA.

Queridos amigos, aqui está o belo editorial da revista dos jesuítas LA CIVILTÀ CATTOLICA, n 3960/2015, sobre a próxima encíclica do Papa Francisco que será publicada na próxima quinta-feira, dia 18. A tradução é de Moisés Sbardelotto e está publicada na página da IHU.  O empenho do Papa Francisco nos impulsiona a uma espititualidade ecológica, a uma vida espiritual e sacramental que não seja alheia ao fato de que habitamos a criação... 

Eis o t exto.
Em 1971, o Bem-aventurado Papa Paulo VI, na carta apostólica escrita para o 80º aniversário da publicação da Rerum novarum, dirigiu aos fiéis um convite profético relativo a "novas perspectivas" para as quais "o cristão deve dedicar a sua atenção, para assumir, junto com os outros homens, a responsabilidade de um destino que já se tornou comum".
As novas perspectivas indicadas pelo papa eram as de um "problema social de vastas dimensões que diz respeito à família humana inteira" e foram abordadas no parágrafo intitulado "O ambiente natural".
Como a Igreja entendeu, ao menos nos últimos 50 anos, a preocupação ecológica? O ambiente ainda é nossa "casa"? Qual é a mensagem do Magistério sobre um tema que foi se impondo cada vez mais e que, agora, graças à encíclica do Papa Francisco, torna-se um capítulo importante da Doutrina Social da Igreja?
O pontífice havia dito isso justamente na homilia do dia da inauguração do seu ministério petrino, 19 de março de 2013: "Guardar a criação inteira" é "um serviço que o Bispo de Roma é chamado a cumprir".



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Guardar a criação inteira - 1.

A responsabilidade de um destino comum
Em uma linguagem áulica, a ponto de parecer antigo, Paulo VI escreveu, há quase meio século, com clarividência e com sabedoria totalmente contemporânea a nós e aberta ao futuro: "À medida que o horizonte do homem assim se modifica, a partir das imagens que se selecionam para ele, uma outra transformação começa a se fazer sentir, consequência tão dramática quanto inesperada da atividade humana. De um momento para outro, o homem toma consciência dela: por motivo da exploração inconsiderada da natureza, começa a correr o risco de destruí-la e de vir a ser, também ele, vítima dessa degradação. Não só já o ambiente material se torna uma ameaça permanente, poluições e lixo, novas doenças, poder destruidor absoluto; é o próprio quadro humano que o homem não consegue dominar, criando assim, para o dia de amanhã, um ambiente global que poderá tornar-se-lhe insuportável" (Octogesima adveniens, n. 21).

A exploração irracional da natureza não só prejudica gravemente o ambiente, mas também põe um grave problema social e humano. A mensagem fundamental de Paulo VI, que permaneceu praticamente não ouvida durante décadas pelos responsáveis econômicos e políticos, precisa ser repetida e posta em evidência também no dia de hoje.
Entre os anos 1970 e o início dos anos 1990, em muitas sociedades, a consciência das ameaças ecológicas cresceu de forma consistente e progressiva.
São João Paulo II foi o primeiro papa a falar das consequências do crescimento industrial, das enormes concentrações urbanas e do notável aumento do consumo energético.
Quem falou do crescimento dessa consciência ecológica daqueles anos foi o Papa Bento XVI, muitos anos depois, perante o Parlamento federal alemão, no dia 22 de setembro de 2011, durante a sua viagem apostólica à Alemanha: "O aparecimento do movimento ecológico na política alemã a partir dos anos 1970, apesar de talvez não ter aberto janelas, todavia, foi e continua sendo um grito que anseia por ar fresco, um grito que não se pode ignorar nem pôr de lado, porque se vislumbra nele muita irracionalidade. Pessoas jovens se deram conta de que, nas nossas relações com a natureza, há algo que não está bem; que a matéria não é apenas um material para o nosso fazer, mas que a própria terra traz em si a sua dignidade, e nós devemos seguir as suas indicações".
E prosseguiu, confirmando a atualidade dessas reivindicações: "Quando na nossa relação com a realidade há algo que não funciona, então devemos todos refletir seriamente sobre o conjunto, e todos somos remetidos à questão acerca dos fundamentos da nossa própria cultura".
São João Paulo II: ecologia ambiental e ecologia humana
São João Paulo II – sensível aos sinais dos tempos – expressou essa sensibilidade na sua encíclica Sollicitudo rei socialis (SRS) (30 de dezembro de 1987), afirmando que "é preciso levar em conta a natureza de cada ser e as ligações mútuas entre todos, em um sistema ordenado, que é justamente o cosmos" (SRS 34).
E especificou as raízes bíblicas da questão ecológica, pondo em evidência que "a limitação imposta pelo próprio Criador, desde o princípio, e expressa simbolicamente com a proibição de 'comer o fruto da árvore' (cf. Gn 2, 16-17), mostra com suficiente clareza que, em relação à natureza visível, nós estamos submetidos a leis não só biológicas, mas também morais, que não podem ser impunemente transgredidas" (ibid).
No fim dos anos 1980, o pontífice advertia contra a utilização dos recursos naturais – alguns dos quais não são renováveis – como se fossem inesgotáveis. E também via na industrialização um risco para a contaminação do ambiente e para a qualidade de vida (cf. ibid).
Em particular, a sua Mensagem para o XXIII Dia Mundial da Paz foi toda centrada no tema "Paz com Deus criador, paz com toda a Criação" (1º de janeiro de 1990). O seu pensamento foi expressado com clareza: "O gradual esgotamento do estrato do ozônio e o consequente 'efeito estufa' que ele provoca já atingiram dimensões críticas, por causa da crescente difusão das indústrias, das grandes concentrações urbanas e dos consumos de energia. Dejetos industriais, gases produzidos pela combustão de combustíveis fósseis, desmatamento incontrolado, uso de alguns tipos de herbicidas, refrigerantes e propelentes, tudo isso, como se sabe, é nocivo para a atmosfera e para o ambiente".
Nessa mensagem se falava, portanto, de aquecimento global e dos efeitos das mudanças climáticas ainda antes que os termos entrassem no uso comum. Afirmava-se um verdadeiro "direito a um ambiente seguro, como de um direito que deve passar a figurar em uma Carta atualizada dos direitos do homem" (grifo nosso). Mas, acima de tudo, falava-se da "urgente necessidade moral de uma nova solidariedade, especialmente nas relações entre os países em vias de desenvolvimento e os países altamente industrializados" (grifo nosso).
João Paulo II observava como os Estados devem se mostrar solidários, mas também, entre si, "complementares" na promoção do desenvolvimento de um ambiente natural e social pacífico e saudável.
De fato, aos países recém-industrializados "não se pode requerer que apliquem certas normas ambientais restritivas às próprias indústrias nascentes, se os países industrializados não forem os primeiros a aplicá-las no seu interior". Não se pode pensar a ecologia fora dos termos da justiça.
Na sua carta encíclica Centesimus annus (CA) (1º de maio de 1991), São João Paulo II tematizou a "questão ecológica", ligando-a estreitamente ao problema do consumismo e daquele que ele definiu como um "erro antropológico": "O homem, tomado mais pelo desejo do ter e do prazer, do que pelo de ser e de crescer, consome de maneira excessiva e desordenada os recursos da terra e da sua própria vida. Na raiz da destruição insensata do ambiente natural, há um erro antropológico, infelizmente muito espalhado no nosso tempo. O homem, que descobre a sua capacidade de transformar e, de certo modo, criar o mundo com o próprio trabalho, esquece que este se desenrola sempre sobre a base da doação originária das coisas por parte de Deus. Pensa que pode dispor arbitrariamente da terra, submetendo-a sem reservas à sua vontade, como se ela não possuísse uma forma própria e um destino anterior que Deus lhe deu, e que o homem pode, sim, desenvolver, mas não deve trair. Em vez de realizar o seu papel de colaborador de Deus na obra da criação, o homem substitui-se a Deus e, desse modo, acaba por provocar a revolta da natureza, mais tiranizada do que governada por ele" (CA 37; grifo nosso).
O pontífice, portanto, fazia uma clara oposição entre a "mesquinhez da visão humana, mais animada pelo desejo de possuir as coisas" e a justa disposição em relação ao mundo, aquela "desinteressado, gratuito, estético que brota do assombro diante do ser e da beleza, que leva a ler, nas coisas visíveis, a mensagem do Deus invisível que as criou" (ibid, grifo nosso).
A questão ecológica já era posta por São João Paulo II em uma perspectiva mais ampla e ligada ao ambiente humano mais abrangente. O seu objetivo era o de salvaguardar as condições morais de uma autêntica "ecologia humana" (CA 38).
A atenção à preservação dos habitats naturais das diversas espécies animais ameaçadas de extinção deve ir de mãos dadas com o respeito pela estrutura natural e moral, da qual o homem foi dotado. Daí a atenção aos "graves problemas da moderna urbanização, a necessidade de um urbanismo preocupado com a vida das pessoas, bem como a devida atenção a uma 'ecologia social' do trabalho".
O pontífice falou da necessidade de ter coragem e paciência para "demolir" as estruturas contrárias à humanidade do ambiente e "substituí-las com formas de convivência mais autênticas" (ibid).
A encíclica Evangelium vitae (EV) (25 de março de 1995) afirma com decisão que nós, homens, "em relação à natureza visível, estamos submetidos a leis, não só biológicas, mas também morais, que não podem ser impunemente transgredidas" (EV 42). A crise ecológica é entendida como espelho de uma crise moral.
Posteriormente, em 1997, falando aos participantes de um congresso sobre ambiente e saúde, o pontífice relançou o apelo "a conjugar as novas capacidades científicas com uma forte dimensão ética", a fim de promover o ambiente não apenas como "recurso", mas acima de tudo como "casa" para se habitar.
Em síntese extrema: São João Paulo II estabeleceu os parâmetros da reflexão da Igreja em relação a esse preocupante desafio então relativamente novo. Destruir a harmonia ambiental é um pecado, porque aliena os seres humanos de si mesmos e da terra.
É central a "relação" entre a humanidade e o restante da criação, que deve ser alimentada com amor e sabedoria. A crise ambiental não é só científica e tecnológica: é fundamentalmente moral.
Da mensagem "Paz com Deus criador. Paz com toda a Criação" de 1990 e da Cúpula do Rio de 1992, a discussão seguiu adiante por 25 anos. Certamente, as questões em jogo são complexas: acima de tudo, em nível científico, depois político e, finalmente, em nível econômico e comercial.
Lembramos que uma etapa importante dessa reflexão foi constituída – e continua sendo – pelos discursos e iniciativas ecológicas pioneiros do Patriarca Ecumênico Bartolomeu I, desde 1994, como os simpósios internacionais na ilha dePatmos e vários seminários.
Em 1997, por exemplo, ele também, de forma clara e convincente, explicitou as implicações da questão ecológica em termos de pecado: "Cometer um crime contra o mundo natural é um pecado. Para os seres humanos, causar a extinção das espécies, destruir a diversidade biológica da criação de Deus; para os seres humanos, degradar a integridade da Terra, causando mudanças climáticas, privando-a das suas florestas naturais ou destruindo as suas zonas úmidas; para os seres humanos, ferir os outros seres humanos com a doença; para os seres humanos, contaminar as águas da Terra, a sua terra, o seu ar e a sua vida com substâncias venenosas: esses são pecados" (Patriarca Bartolomeu I,Discurso ao Simpósio sobre o AmbienteSanta BarbaraEUA, 8 de novembro de 1997).
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Guardar a criação inteira - 2.

Bento XVI: discernimento e projetualidade
Papa Ratzinger foi muitas vezes definido como "o primeiro papa verde" (cfr., por exemplo, National Geographic, 28 de fevereiro de 2013), por ele ter assumido muitas reivindicações ambientais e ecológicas herdadas do seu antecessor e, depois, desenvolvendo-as ainda mais.
Na sua Mensagem para o XL Dia Mundial da Paz (1º de janeiro de 2007), ele retoma e consolida o trinômio inseparável entre "ecologia da natureza", "ecologia humana" e "ecologia social". É muito forte, na sua mensagem, o vínculo entre a questão ecológica e o fato de que, em algumas regiões do planeta, ainda se vivem condições de grande atraso, em que o desenvolvimento está praticamente bloqueado, também por causa do aumento dos preços da energia.
O papa pergunta: "Que será dessas populações? Que tipo de desenvolvimento ou de não desenvolvimento lhes será imposto pela escassez de reabastecimento energético? Que injustiças e antagonismos provocará a corrida às fontes de energia? E como reagirão os excluídos dessa corrida?".
O mesmo tom interrogativo seria usado pelo Papa Bento XVI na sua Mensagem para o XLIII Dia Mundial da Paz (1º de janeiro de 2010): "Como ficar indiferente diante das problemáticas que derivam de fenômenos como as mudanças climáticas, a desertificação, o deterioramento e a perda de produtividade de vastas áreas agrícolas, a poluição dos rios e dos lençóis de água, a perda da biodiversidade, o aumento de eventos naturais extremos, o desflorestamento das áreas equatoriais e tropicais? Como ignorar o fenômeno o crescente dos chamados 'prófugos ambientais', ou seja, pessoas que, por causa da degradação do ambiente onde vivem, se veem obrigadas a abandoná-lo – muitas vezes junto com os seus bens – para enfrentar os perigos e as incógnitas de um deslocamento forçado? Com não reagir diante dos conflitos já em ato ou dos potenciais ligados ao acesso aos recursos naturais?".
Essas perguntas do "papa verde" – que já poderiam, por si sós, constituir uma lista de temas a serem abordados – têm um profundo impacto sobre o exercício dos direitos humanos, como o direito à vida, à alimentação, à saúde e ao desenvolvimento.
Certamente, a encíclica Caritas in Veritate (CV) (29 de junho de 2009) foi uma etapa fundamental do seu pensamento "verde", que reuniu inúmeros âmbitos: o ecológico, o jurídico, o econômico, o político, o cultural (cfr. CV 48).
De fato, "a natureza, especialmente no nosso tempo, está tão integrada nas dinâmicas sociais e culturais que quase já não constitui uma variável independente" (CV 51).
Bento XVI advertiu contra a posse dos recursos energéticos não renováveis e relembrou a urgência de uma solidariedade que leve a "uma redistribuição mundial dos recursos energéticos, de modo que os próprios países desprovidos possam ter acesso a eles" (CV 49).
Eis o seu apelo: "Há espaço para todos nesta nossa terra: nela, a família humana inteira deve encontrar os recursos necessários para viver dignamente, com a ajuda da própria natureza, dom de Deus aos seus filhos, e com o empenho do próprio trabalho e da própria criatividade" (CV 50).
Na Audiência Geral do dia 26 de agosto de 2009, Bento XVI reiterou que "a proteção do ambiente, a tutela dos recursos e do clima requerem que os responsáveis internacionais atuem conjuntamente no respeito à lei e da solidariedade, sobretudo em relação às regiões mais frágeis da terra".
Portanto, "é indispensável converter o atual modelo de desenvolvimento global para uma maior e compartilhada assunção de responsabilidade em relação à criação: isso é exigido não só pelas emergências ambientais, mas também pelo escândalo da fome e da miséria".
A proposta do papa é de fazer com que a atual crise se torne "ocasião para discernimento e de nova projetualidade" (CV 21). A própria técnica deve ser considerada como aliada, porque manifesta as aspirações humanas ao desenvolvimento e à gradual superação de certos condicionamentos materiais, inserindo-se no comando de "cultivar e guardar a terra que Deus confiou ao homem" (CV 69).
Bento XVI reiterou que a questão ecológica diz respeito aos cristãos justamente como pessoas de fé e à Igreja como tal: "A Igreja tem uma responsabilidade pela criação e deve fazer valer essa responsabilidade também em público. E, ao fazer isso, deve defender a terra, a água e o ar como dons da criação que pertencem a todos. Deve proteger o homem contra a destruição de si mesmo" (CV 61).
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Guardar a criação inteira - 3.

Francisco: proteção e harmonia
Há dois anos, desde o início do seu pontificado, o Papa Francisco somou a sua voz, a voz da Igreja universal, à discussão mundial mais recente. Com a sua linguagem eficaz e direta, ele não hesitou de afirmar: "Em grande parte, é o homem que maltrata a natureza, continuamente. Nós nos apoderamos um pouco da natureza, da irmã terra, da mãe terra. Lembro-me – vocês já ouviram isto – daquilo que um velho agricultor me disse uma vez: 'Deus perdoa sempre, nós – os homens – algumas vezes, a natureza, nunca'" (coletiva de imprensa em voo para Manila durante a sua viagem apostólica ao Sri Lanka e às Filipinas, 15 de janeiro de 2015).
No seu magistério, aparece clara desde o início uma visão global, holística, em continuidade com os seus antecessores. Seres humanos, natureza e ambiente, criação e sociedade estão ligados entre si: "Ecologia humana e ecologia ambiental caminham juntas" (Audiência Geral, 5 de junho de 2013).
Lendo os seus discursos, nota-se, em particular, que ele tem uma visão antropológica, mas não antropocêntrica no sentido redutivo do termo. Uma das suas palavra-chave é "harmonia", mais ampla do que "reconciliação" e capaz de se estender a todas as criaturas. A harmonia, de fato, diz respeito a toda a criação no seu conjunto e nas relações entre seres vivos. E é um dom de Deus.
Assim afirmou Francisco na Audiência Geral do dia 22 de abril de 2015, em que se celebrava o "Dia da Terra": "Exorto todos a verem o mundo com os olhos de Deus Criador: a terra é o ambiente a se guardar e o jardim a se cultivar. Que a relação dos homens com a natureza não seja guiada pela avidez, pela manipulação e pela exploração, mas conserve a harmonia divina entre as criaturas e a criação na lógica do respeito e do cuidado, para pô-la a serviço dos irmãos, também das gerações futuras" (grifo nosso).


Essa visão ampla, atenta às "relações" e não só ao homem entendido como "centro", interroga-se sobre qual impacto o progresso econômico, as novas tecnologias e o sistema financeiro têm sobre os seres humanos e sobre o ambiente: "E o perigo é sério – continuou o papa na audiência do dia 5 de junho de 2013 – porque a causa do problema não é superficial, mas profunda: não é só uma questão de economia, mas de ética e de antropologia. A Igreja ressaltou isso várias vezes, e muitos dizem: 'Sim, é justo, é verdade'... mas o sistema continua como antes, porque o que domina são as dinâmicas de uma economia e de uma finança carentes de ética. O que manda hoje não é o homem, é o dinheiro, o dinheiro manda. E Deus, nosso Pai, deu a tarefa de guardar a terra não para o dinheiro, mas para nós: aos homens e às mulheres, nós temos essa tarefa! Ao contrário, homens e mulheres são sacrificados aos ídolos do lucro e do consumo: é a 'cultura do descarte'".
Um conceito-chave do Papa Francisco, repetido várias vezes desde a missa de inauguração do seu ministério petrino, é o da "custódia" da terra, tendo como referência o "Seja!" criativo de Deus, por um lado, e o louvor à criação deFrancisco de Assis, por outro.
Justamente com essas palavras, de fato, o papa deu início ao seu pontificado no dia 19 de março de 2013: "A vocação de guardar, porém, não diz respeito apenas a nós, cristãos, mas tem uma dimensão que precede e que é simplesmente humana, diz respeito a todos: é guardar a criação inteira, a beleza da criação, como nos é dito no livro do Gênesis e como nos mostrou São Francisco de Assis: é ter respeito por toda a criatura de Deus e pelo ambiente em que vivemos".
Daí o convite: "Sejamos 'guardiões' da criação, do desígnio de Deus inscrito na natureza, guardiões do outro, do ambiente; não deixemos que sinais de destruição e de morte acompanhem o caminho deste nosso mundo!".
O "domínio" sobre a terra que Deus garante ao homem não é o do chefe, que é Deus somente, Senhor do céu e da terra, mas o da custódia e da administração. Os bons administradores tratam a natureza com respeito, que gera um estilo de vida simples e sóbrio, que contribuirá para preservar o ambiente para as gerações futuras.
Papa Francisco retomou essas primeiras palavras como pontífice na sua exortação apostólica Evangelii gaudium(EG) (24 de novembro de 2013): "Nós, os seres humanos, não somos meramente beneficiários, mas guardiões das outras criaturas. Pela nossa realidade corpórea, Deus uniu-nos tão estreitamente ao mundo que nos rodeia, que a desertificação do solo é como uma doença para cada um, e podemos lamentar a extinção de uma espécie como se fosse uma mutilação. Não deixemos que, à nossa passagem, fiquem sinais de destruição e de morte que afetem a nossa vida e a das gerações futuras" (EG 215).
A condenação do sistema "que tende a fagocitar tudo, a fim de aumentar os benefícios" é clara, porque, nele, "qualquer realidade que seja frágil, como o meio ambiente, fica indefesa em relação aos interesses do mercado divinizado, transformados em regra absoluta" (EG 56). Portanto, "esta é a primeira resposta à primeira criação: guardar a Criação, fazê-la crescer" (homilia em Santa Marta, 9 de fevereiro de 2015).
Somando a sua voz à voz dos seus antecessores – e na forma específica da encíclica –, o Papa Francisco levanta perguntas e raciocínios. Confiamos que muitos, acolhendo o desafio em termos de fé e de escolhas operativas, serão profundamente gratos pelo fato de que um líder mundial teve a coragem de chamar todos a um futuro mais sustentável e inclusivo.
E o apelo de Francisco, de fato, não é frágil, mas contundente, como na Conferência de Lima (27 de novembro de 2014): "O tempo para encontrar soluções globais está a acabar. Só podemos encontrar soluções adequadas se agirmos juntos e de comum acordo. Portanto, existe um claro, definitivo e improrrogável imperativo ético de agir".
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