Louvado sejas, meu Senhor, por todas as tuas criaturas!

Há meses fala-se da publicação de uma nova encíclica pelo Papa Francisco; desta vez, sobre questões ambientais. Agora é fato: dia 18 de junho será publicada a encíclica prometida, ainda sem título conhecido; mas o tema é mesmo o das questões ambientais, com suas várias implicações.
Não é a primeira vez que o Magistério da Igreja se ocupa com questões ambientais. Bento XVI já abordou o tema na encíclica Caritas in Veritate (2009), convidando a humanidade a um novo relacionamento com a natureza, tendo em conta o desígnio de Deus Criador e a solidariedade social (cf nº 48-52). Tratou da ecologia do ponto de vista ético – da “urgente necessidade moral de uma nova solidariedade”; ensinou que a responsabilidade pelo cuidado da natureza é global; que é preciso pensar num “governo responsável sobre a natureza para cuidar dela, fazê-la frutificar e cultivar, para que ela possa acolher e alimentar dignamente a família humana e quem mais nela habita.
Os ensinamentos de Bento XVI são fundamentais para a dimensão ética da nossa relação com a natureza: “o ambiente natural não é apenas matéria de que possamos dispor ao nosso bel-prazer, mas obra admirável do Criador, contendo uma ‘gramática’, que indica finalidades e critérios para uma utilização sábia, e não instrumental ou arbitrária” (nº 48). Na sua encíclica, Bento XVI também oficializou na linguagem do Magistério da Igreja o conceito de “ecologia humana”, tratando da correta convivência das pessoas em sociedade e em relação ao meio ambiente.
O Papa Francisco, desde que foi eleito, deu sinais de que esta também seria uma preocupação sua. Nem poderia ser diferente, pois é missão do Magistério falar do sentido sobrenatural de toda realidade. Pouco tempo depois de eleito, na audiência geral de 5 de junho de 2013, já falou da necessidade de adequar o progresso econômico e o uso das novas tecnologias ao respeito pela natureza e pela “ecologia humana”. Em várias ocasiões, nos 27 meses de seu pontificado, retornou às temáticas ambientais, mostrando suas implicações para a fé e a moral, a solidariedade social e a paz.
A publicação de sua encíclica reúne, agora, uma reflexão sistemática sem precedentes sobre a ecologia. Ninguém imagine que o Papa esteja interessado em alguma ideologia ou partido ambientalista... As questões postas têm basicamente três grandes motivações, à luz das quais convém ler a encíclica.
Em primeiro lugar, a questão tem a ver com a fé cristã no Deus Criador. Estamos sendo levados, por teorias correntes sobre as origens do universo, a “crer” que o mundo surgiu por si mesmo, descartando a necessidade de um Criador. A teoria da evolução não é incompatível com a fé cristã, contanto que não exclua o Deus Criador. Mas a exclusão absoluta do ato criador de Deus – “no princípio” – requer um ato de fé ainda maior do que a fé no Deus Criador. Precisamos voltar a valorizar o primeiro artigo de nossa profissão de fé: “Creio em Deus, Pai Criador do céu e da terra...” Tratar com o devido respeito a natureza, obra de Deus, é consequência de nossa fé em Deus.
Em segundo lugar está a preocupação com a responsabilidade do homem sobre a natureza: ao homem está entregue o cuidado da natureza, que é a “casa comum” da família humana e o “jardim”, que acolhe, sustenta e alegra a família humana e as demais criaturas. Não podemos nos considerar os “donos absolutos do mundo” e nos transformar em predadores da natureza; dela devemos ser cultivadores responsáveis, para que continue a ser pródiga de bens para as criaturas de Deus que ela abriga. Estragar e depredar a natureza é pecado contra Deus e o próximo.
A terceira “preocupação ambiental” do Magistério do Papa Francisco e da Igreja é a da solidariedade social: a terra, com seus frutos, o ar, a água e a luz do sol são para todos; a natureza não é propriedade de ninguém em absoluto, mas um bem destinado a todas as criaturas de Deus. O uso egoísta e ganancioso da natureza é contrário à justiça, à solidariedade e à paz. E ameaça a sustentabilidade da própria natureza.
São Francisco de Assis compreendeu isso muito bem e o expressou no seu Cântico das Criaturas: “louvado sejas, meu Senhor, pelo irmão sol, pela mãe terra, pela irmã água... e por todo ser!” Convido a acolher e ler a encíclica com profundo interesse.
Publicado no jornal O SÃO PAULO - Edição 3056, de 17 a 23 de junho de 2015

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