Theotokos

Amanhã, Oitava do Santo Natal, a Igreja celebra a Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus. É uma festa antiga, na qual os cristãos saúdam a Virgem Santíssima porque através dela nos veio o Salvador do mundo. No Oriente cristão, a Igreja faz essa saudação no dia 26 de dezembro, pois os orientais têm o costume de congratular-se com as mulheres que dão à luz logo no dia seguinte ao parto, cumprimentando-as pelo dom da maternidade. Daí o belo costume: no dia seguinte ao Natal, os cristãos congratulam-se com a Mãe de Deus pelo Filho que ela gerou e deu à luz. Jesus, o Nascido por nós, é Deus verdadeiro e perfeito; por isso a Virgem pode ser chamada verdadeiramente de Mãe de Deus.
Mas, esta festa e este título, mais que falar de Maria, falam do Filho dela nascido. Jesus é Deus, é uma Pessoa divina, a segunda da Trindade: Deus como o Pai e Deus como o Espírito Santo. Nossa fé nos ensina que há um só Deus, uma só natureza divina, infinita, perfeita e eterna. Ora, esta natureza divina é a única natureza do Pai e do Filho e do Espírito Santo, de modo que o Pai é verdadeiro e único Deus (pois só há uma natureza divina), o Filho é verdadeiro e único Deus e o Espírito Santo, igualmente, é verdadeiro e único Deus. Não são três naturezas iguais, mas uma só natureza que é do Pai e do Filho e do Espírito Santo!
Pois bem, a segunda Pessoa da Trindade santa, sem deixar de ser Deus, sem deixar sua natureza divina, assumiu de verdade a natureza humana, igual a nossa, em Maria Virgem. Então, Jesus é uma Pessoa divina, a segunda da Trindade, que sempre possuiu a natureza divina e, agora, por nós e para nossa salvação, assumiu também uma natureza humana, limitada e frágil como a nossa. E essa natureza humana ele a recebeu de sua mãe, a Virgem Maria. O Filho eterno não somente se encarnou em Maria, mas "de Maria", isto é, recebeu dela sua carga genética, suas características humanas, a ponto de Santo Agostinho afirmar com ousadia: "A carne de Cristo é carne d e Maria".
Mas, concretamente, que é uma pessoa? Que é uma natureza? Pessoa, no sentido teológico, é o "eu" que age, que pensa, que sente, que está por baixo de todas as ações, vivências e escolhas da vida. Quem tem sede? Quem ama? Quem sorriu? Quem morreu? Foi Fulano. Este Fulano é a pessoa, o sujeito de todas as vivências e ações. Pois bem, Jesus é uma Pessoa divina - a segunda da Trindade: na sua vida entre nós, tudo quanto ele fez era ação da Pessoa divina que ele é. Assim: quem curou o cego? A segunda Pessoa da Trindade. Quem dormiu no barco no Mar da Galiléia? A segunda Pessoa da Trindade. Quem nasceu da Virgem? A segunda Pessoa da Trindade. Quem sofreu e morreu na cruz? A segunda Pessoa da Trindade! Mas como é possível uma Pessoa da Trindade, uma Pessoa divina, experimentar tudo isso?
Aqui vem o significado de natureza. Natureza é o modo concreto como a pessoa vive, age, sente, pensa, decide, se exprime. Eu sou uma pessoa humana que vivo concretamente numa natureza humana: vivo a ajo como homem, de acordo com a natureza humana. Assim também Jesus: sua Pessoa divina viveu e agiu entre nós de modo humano, vivendo e sentindo tudo que um ser humano vive e sente! Recorde que a natureza humana é composta de corpo e alma racional. Assim, Jesus, como homem, tem um corpo e uma alma humana. Dizer alma é dizer consciência, vontade, conhecimento liberdade, afeto... Tudo isto Jesus tem igual a nós: conhecia como homem, sentia como homem, sofria como homem, tinha limitações naturais de homem, tinha vontade de homem e sentimentos humanos. Foi igual a nós em tudo, menos no pecado que não é humano, mas desumano! Então, voltando para as perguntas do parágrafo anterior: Como pode a segunda Pessoa da Trindade dormir? Como homem! Como pode sofrer e morrer? Como homem, na sua natureza humana! E a sua natureza divina? É a do Pai e do Espírito Santo, que não pode sofrer nada disso. Na sua natureza divina ele enche o céu e na sua natureza humana dorme no presépio; na sua natureza divina sustenta e governa o céu e a terra e na sua natureza humana é alimentado por Maria e guardado por José! Eis que mistério tão grande.
Ora, tudo isto começou no seio da Virgem: ela gerou de verdade o Filho eterno como homem. Jesus nunca diria: Maria é mãe da minha natureza humana. Ele diria: Maria é minha mãe - mãe de minha Pessoa (divina) na natureza humana. Exatamente para deixar isso claro é que a Igreja desde os primórdios chama Maria de Mãe de Deus, isto é Mãe de Deus Filho feito homem. Professar que Maria é verdadeiramente Mãe de Deus é proclamar que no seu ventre bendito, Deus-Filho humanizou-se, isto é, veio realmente fazer-se homem e viver tudo que nós humanos vivendo. Fazendo-se homem, trouxe-nos a sua vida divina; abaixando-se, nos ergueu; tornando-se servo por nós, deu-nos a realeza divina; tomando a nossa pobre condição, enriqueceu-nos com a sua divindade. E tudo isto começou no puríssimo seio da bendita Virgem Maria! É este mistério que a Igreja, admirada e agradecida, contempla e proclama e celebra na sagrada Liturgia.
"Verdadeiramente é digno bendizer-te, ó Mãe de Deus! Bem-aventurada imaculada para sempre, Mãe do nosso Deus! Mais venerável que os Querubins e incomparavelmente mais gloriosa que os Serafins! Tu, que conservando tua integridade, deste à luz o Verbo de Deus! Tu és na verdade Mãe de Deus! Nós te glorificamos!"





Dom Henrique Soares

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